A CP Carga foi vendida. Contra os
agoiros de muitos que afirmavam que a empresa não tinha valor; contra os
opositores da solução que nunca entenderam a obrigatoriedade da venda; contra
um setor recheado de técnicos especialistas, académicos e teóricos, gestores
com experiência; contra muitos dos trabalhadores e, principalmente, contra os
sindicatos que nunca querem fazer parte de qualquer solução, a CP Carga acabou
por ser vendida, a meses do fim da legislatura. Indignação, desilusão,
apreensão e pena foram, porventura, sentimentos comuns a muitos de nós.
Enquanto cidadão tive pena, muita pena,
que o único fim possível tivesse sido este. Ouvi inúmeras teorias, estratégias,
planos e modelos de salvação para a empresa, mas todos eles desvalorizavam um
erro antigo e que fez parte integrante do seu código genético: a capacidade de
gerir o ativo.Desde a revolução de Abril, o Estado teve a capacidade ímpar de o
desvalorizar de forma militante e continuada. O atual Governo, obrigado pela
Troika, teve a capacidade de o vender, não sem antes encontrar formas criativas
e com maestria de o valorizar. Por último, o setor empresarial português também
não encontrou capacidade para, no todo ou em parte, o tomar em mãos. Mais uma
vez ficou demonstrada a incompetência de muitos, a habilidade de alguns e a
fragilidade ou falta de rasgo de outros.
Este pode ser o resumo da história de
uma empresa, que na minha singela opinião, representa um valor estratégico para
a Economia superior ao da TAP. A diferença da notoriedade de ambas as empresas
e sua visibilidade junto da população, terão, por certo, contribuído em muito
para a perceção contrária.
Sendo esta opinião discutível, julgo ser
consensual o reconhecimento do altíssimo valor estratégico que tem o transporte
ferroviário de mercadorias como pilar, e alavanca desbloqueadora, do sistema
portuário nacional.
Este setor é essencial para exponenciar
as capacidades que o País tem e pode ter para que se afirme como um hub do
comércio à escala ibérica e europeia, e como lugar de referência no comércio
marítimo mundial, capitalizando o valor do seu posicionamento geoestratégico.
É bom de ver e fácil de entender. Basta
recordar que quando assim olhámos para Portugal, crescemos como povo e nação e
demos novos mundos ao mundo. Esta foi nossa incapacidade!
A CP Carga foi vendida! E agora? Portugal
perdeu ou ganhou? Perdeu alguma coisa, mas acredito que ganhou
mais! Perdeu a propriedade do ativo e a tempo o destino deste. E sob esse
ponto de vista... lá se vai mais um anel!Mas ganhou mais! Ao ser adquirida por
um armador global, fortemente posicionado em Portugal e Espanha - e com a
ambição de alcançar a liderança ibérica no transporte ferroviário de
mercadorias - a empresa vai assegurar através dos fluxos próprios em Portugal e
Espanha e dos existentes nos dois mercados, que Portugal se afirme como
presença incontornável na cadeia de comércio ibérico, europeu e mundial.
Acredito que os novos proprietários
tragam mais sucesso, mas o setor está expectante em perceber a força e a
autoridade do regulador na promoção da livre e sã concorrência e da defesa
intransigente do interesse nacional.
Uma palavra final. Estou curioso para
saber quanto tempo a Autoridade da Concorrência vai levar a dar o seu parecer
sobre a venda da CP Carga, tendo em conta os três anos que demorou a
identificar os constrangimentos do setor portuário, identificados pelo Governo
nos seus primeiros seis meses de mandato. Por José Monteiro Limão
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